sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Parashá Vayigash

Parashah Vayigash

Bereshit / Gênesis 44:18-47:27

Resumo da Parashah:

No capítulo 45 de Bereshit, Judá fala a José oferecendo-se para se colocar no lugar de Benjamin, que o segundo quer reter no Egito. Então José não consegue se conter e se faz conhecer como o irmão perdido há tantos anos. Perdoa os irmãos e não lhes impõe culpa, ao contrário, diz que tudo foi um plano de D’us para a salvação de todos.

Ele chama toda sua família para morar no Egito, amparado e estimulado pelo Faraó. Envia os irmãos ao pai cheios de presentes e estes anunciam a ele o fato de José estar vivo. Jacob não acredita de início, mas vendo os carros mandados por José, termina acreditando.

No capitulo 46 de Bereshit, Deus fala a Jacob e o envia à terra do Egito, dizendo que irá com ele, e que lá Ele fará de seu povo uma grande nação. Todos partem para o Egito. Segue a enumeração das famílias dos filhos de Jacob que foram para o Egito, sessenta e seis pessoas, setenta se contando o próprio Jacob, José e seus dois filhos.

No capítulo 47, a família ocupa a terra de Goshen e Jacob abençoa a Faraó.
A fome continua na terra, e, tendo recolhido toda prata do povo em troco de comida, agora José recebe gado e terra, e, apesar de os egípcios se oferecem como escravos, José não aceita. Ele coloca o povo para semear sobre toda a terra agora pertencente Faraó (com a exceção da terra dos sacerdotes) devendo devolver-lhe o quinto da colheita.

Comentário:

No início da Parashá, em Bereshit 44:33 está escrito:
Agora fique, rogo, teu servo em lugar do moço, como escravo de meu senhor, e o moço suba com seus irmãos.
Judá, em sua fala, tipifica Yeshua. Ele se oferece para se colocar no lugar de Benjamin, assim como Y’shua se colocou em nosso lugar.

No capítulo 45 verso 5, lemos:
E agora, não vos entristeçais e não vos irriteis por me haverdes vendido para cá, porque para preservar vossa vida me mandou Deus adiante de vos, para vos dar uma descendência sobre a terra e fazer-vos viver uma grande salvação.

O sentido original de grande salvação, em hebraico, lifleitah gedolah, é: por meios extraordinários dar grande livramento, manter vivo, dar uma grande sobrevivência, assegurar-se de que muitos sobrevivam.

Nessa passagem, José é o tipo de Y’shua; aquele que Hashem usou, enviando para a terra do Egito (a Terra), onde viveu e sofreu injustiças, foi encontrado sem mácula, como José, apesar das acusações de muitos, foi preso, torturado, e depois exaltado por Hashem, para nos dar grande livramento, para assegurar-se que muitos sobrevivam.

Essa passagem nos fala da postura que devemos ter em relação à morte de Y’shua; muitos acusam o b’nei Yisrael de terem matado Y’shua. A resposta, no entanto, é essa: assim como para preservar a vida Hashem mandou José adiante deles, assim também Y’shua foi morto e sacrificado, para fazer o mundo viver uma grande salvação, concentrando nele todo tikun do mundo e assim possibilitando uma volta ao Pai a todo aquele que assim o desejar, crendo nesse livramento. Era necessário que fosse assim, como ele mesmo afirmou antes que fosse preso e crucificado.

Assim como José, que se acreditava morto, Y´shua ressurge da morte transformado, com novas vestimentas e novo poder, tendo passado pelo sacrifício, e abraça seus irmãos, convidando-os a entrar em um reino de regozijo e saciedade.

Em Bereshit 45:10
José manda um recado dizendo a seu pai que eles habitarão na terra de Goshen. Goshen era uma área no Delta do Nilo a oeste do canal de Suez, ao mesmo tempo perto da capital, onde estava José, e de Canaan. O grande historiador Flavius Josephus identificou a área como a região de Heliópolis, no Cairo, que era considerada a área mais fértil do país.

Quando Hashem chama e envia, ele dá o melhor. José e o Faraó não se contentaram em dar qualquer região do país ao povo de Yisrael, mas a mais fértil e a melhor situada.

No capítulo 45 versículo 24, José diz a seus irmãos, quando se despede deles:
Não tenhais desavenças no caminho.
Vayeshalach et- echan vayelechu vayomer alehem altingezu ladarech

Essa frase foi interpretada de várias maneiras por vários sábios e eruditos judeus:
Não tenhais agitação (Radak)
Não tenhais raiva
Não tenhais desconforto, medo ( Bekor Shor)
Preocupação, (Rahban)
Brigas (Rashi)
Não fiqueis envolvidos com outras coisas pelo caminho

O caminho dos filhos de Yisrael até Canaã para buscarem suas famílias e as trazerem até José e a salvação tipifica o caminho de todos nós até Y’shua e a salvação oferecida através dele por Hashem. Durante essa viagem, vários conselhos nos são dados nas Escrituras e pelo próprio Y’shua, assim como por José a seus irmãos.
Não se agitar (aquietai-vos e sabei que eu sou D’us)
Não ter raiva (Irai-vos, e não pequeis)
Não ter medo (Não temais)
Não ter preocupação (não vos inquieteis pelo que havereis de comer e beber...)
Não ter brigas ( Amai-vos uns aos outros)
finalmente, o não ficar envolvidos pelo caminho nos faz lembrar da parábola do semeador.



Em Bereshit 46: 3
E disse (O Eterno) Eu sou D’us, D’us de teu pai; não temas descer ao Egito, porque lá eu farei de ti uma grande nação. E descerei contigo ao Egito, e Eu te farei subir também, e José porá a mão sobre teus olhos.

Deus falava com Jacó, falou com ele várias vezes em sua vida, e, no entanto, durante todos os anos em que José esteve desaparecido, D’us não lhe disse que seu filho estava vivo, mas deixou-o imerso em sua dor, acreditando na perda do filho querido de Raquel.

Há momentos em que D’us fala e outros em que Ele se cala. Podemos pensar que, se D’us tivesse falado, seu plano de salvação para o povo de Yisrael através de José não teria se realizado. Seu pai teria ido atrás dele, talvez, e ele não teria se tornado o salvador de sua família; se pensarmos que, mais tarde, foi através do acontecido a José que D’us separou o povo de Yisrael e criou sua identidade como povo durante seus 400 anos no Egito, vemos a importância e a utilidade do silêncio de Hashem.

No entanto, mesmo sem falar a Jacob que seu filho estava vivo, o Eterno cuidou dele e concretizou seu plano em sua vida, mantendo-o fiel e íntegro. Muitas vezes temos a tendência de nos preocupar em relação a nossos filhos, a nossas circunstâncias. Queremos saber de tudo, queremos controlar tudo e não nos contentamos com o silêncio de D’us. Que possamos nos lembrar de que Hashem não precisa de nós para cumprir com sua vontade nem para cuidar do modo perfeito dos nossos. Precisamos nos lembrar ainda que os caminhos de Hashem não são os nossos, e que, muitas vezes o que consideramos uma tragédia por não sabermos ou pelo Eterno estar silencioso, lá na frente se revelará como bênção salvadora.

Em 46:4,
Eu descerei contigo ao Egito, e Eu te farei subir também, e José porá a mão sobre os teus olhos.
Quando Hashem diz a Jacob Eu descerei contigo, Ele fala da sua shechinah.

Quando Ele nos envia, seja aonde for, podemos ter certeza de que sua shechinah vai conosco, assim como foi com Jacob para a terra do Egito e como voltou de lá para Canaã, cumprindo com sua promessa a Jacob 400 anos depois, guiando os B’nei Yisrael pelo deserto durante 40 anos de volta à Terra Prometida.

Em 46:5, vemos:

Esse versículo nos remete a outro, em Provérbios 24:16:
Sete vezes cai o justo, e se torna a levantar. Prov 24:16

Segundo a tradição judaica, as sete quedas, as sete angústias de Jacob foram:
Esaú, Labão, o Anjo, Diná, José, Simão e Benjamim.
O Midrash diz, em Tehilim 16:

Se desejas a vida, suporta os sofrimentos.

Hashem não promete que o justo não cairá, mas que ele se levantará após sua queda, pois, como a própria vida de José mostra, os sofrimentos servem para nos aprimorar e nos aproximar de Hashem e de sua missão para nós.
É interessante notar a mudança de postura de Jacob: da incredulidade total, até levantar-se e deixar-se levar por seus filhos, assim que Hashem fala com ele. Que nós possamos nos lembrar de que, como justos, justificados diante do Eterno pela expiação de Y’shua, podemos nos levantar segundo a sua palavra e caminhar em direção à nossa Terra Prometida.

No capítulo 46, versículo 29:

E aprontou José seu carro, e subiu ao encontro de Yisrael, seu pai, em Goshen, e, tendo-se-lhe apresentado, atirou-se sobre o seu pescoço, e chorou muito sobre seu pescoço.

José, com figura de Y’shua, nessa passagem nos remete à parábola do filho pródigo:
Em Lucas 15: 20, lemos:

E, levantando-se, foi para seu pai. Vinha ele ainda longe, quando seu pai o avistou, e, compadecido dele, correndo, o abraçou e beijou.

Como José, na parábola, o Pai é Hashem, que tem uma postura ativa ao receber aquele que está longe. O Eterno não se contenta em ficar no seu lugar e esperar que façamos todo o caminho até ele, mas se levanta e vem ao nosso encontro, nos abraçando e beijando, para que saibamos que somos realmente amados. Foi isso que o Eterno fez enviando Y’shua ao mundo. Caminhou até nós, abraçou-nos e nos beijou, mostrando-nos a sua salvação. Como o filho pródigo voltou a viver na casa do pai onde reinava a abundância, a família de Yosef, faminta e empobrecida, entrou na abundância do Egito.

No capítulo 46:28
Vemos novamente Judá tipificando Y’shua:

E a Judá mandou adiante dele, para José, para preparar-lhes lugar em Goshen; e foram à terra de Goshen.

Assim com Judá, Y’shua foi adiante de nós para nos preparar lugar, como ele mesmo mencionou, na melhor das terras. E nós iremos à terra que ele preparou.

No capítulo 47: 7:

E trouxe José a Jacob seu pai, e pô-lo diante do Faraó. E abençoou Jacob ao Faraó.

Aqui vemos o patriarca de Yisrael abençoando o próprio Faraó e pensamos em todo o caminho que ele percorreu, lutando com homens, lutando com o anjo, perdendo entes queridos, recuperando a esperança. Aquele que recebe a autoridade de Hashem, aquele que é ungido do Eterno, não importa onde esteja, a ele se submetem os que reconhecem o poder do Eterno. Nesse caso, é Jacob, que está sendo materialmente abençoado pelo Faraó e que o abençoa espiritualmente. Dizem alguns eruditos que é por causa dessa benção que a Torah cita que a fome, em vez dos cinco anos restantes, durou apenas dois anos.

A Parashah termina no verso 27 de Bereshit 47, dizendo:

E esteve Yisrael na terra do Egito, na terra de Goshen; e adquiriram possessões, e frutificaram, e multiplicaram-se muito.

Que nós possamos também, como os b’nei Yisrael, adquirir possessões onde a ferrugem não corrói e a traça não come, frutificar a cem por um e multiplicar em muito o número dos que crêem para que possamos entrar, como os filhos de Jacob, na terra de abundância e descanso.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Parashá Miketz

Perdão
José passa 22 anos longe da família, vendido pelos irmãos a mercadores, escravo e preso no Egito, tornando-se mais tarde o segundo homem em autoridade naquele país. 22 anos é muito tempo para remoer uma injustiça. 22 anos é tempo para pensar com detalhes no que fará quando os sonhos, nos quais irmãos se curvam diante dele, se realizarem. Para pensar em que atitude tomará quando os irmãos vierem e se curvarem.
Em 22 anos, o irmão vendido se torna o sub-chefe do Egito. Em 22 anos, ele se transforma no salvador, não só daquele país, mas de toda a população do entorno. A ele vêm aqueles que não se preveniram, aqueles que não tiveram a graça divina de receberem a revelação do que viria e de como se preparar. Em 22 anos, o escravo se transforma em mestre, o rejeitado em adulado por todos. 22 anos é muito tempo para tecer conjecturas sobre o que aconteceu. Sobre a vida do pai, dos irmãos. Sobre o momento da vingança. E o que vemos no centro nessa parashá é a luta interior de um homem. A intensa guerra entre ressentimento e perdão, entre vingança e generosidade. A parashá termina nos deixando em suspense quanto à decisão final de Yossef: perdão ou vingança? Generosidade ou rancor?
A parashá Mikêts fala do processo pelo qual um homem passa até se tornar capaz de perdoar, ou melhor, até que o perdão exploda dentro dele de modo incontrolável. É com muito choro e emoção que veremos na próxima parashá a reconciliação de Yossef e seus irmãos.
O processo ao qual ele os submete, a seus algozes do passado, é longo e doloroso para ambas as partes, cheio de estratagemas, mentiras e subterfúgios. O objetivo? Segundo o Midrash, descobrir se eles tinham realmente se arrependido do que fizeram no passado ou se continuavam a pensar e a agir da mesma maneira. Ou talvez submetê-los a um processo em que fossem levados ao arrependimento pelo que fizeram.
O importante é que tudo isso culmina com um perdão irrestrito e total.
Isso me faz lembrar o que Yeshua falou sobre perdão, em Mateus 18: 22:
¶ Então Pedro, aproximando-se dele, disse: Senhor, até quantas vezes pecará meu irmão contra mim, e eu lhe perdoarei? Até sete?
22 Yeshua lhe disse: Não te digo que até sete; mas, até setenta vezes sete.
23 Por isso o reino dos céus pode comparar-se a um certo rei que quis fazer contas com os seus servos;
24 E, começando a fazer contas, foi-lhe apresentado um que lhe devia dez mil talentos;
25 E, não tendo ele com que pagar, o seu senhor mandou que ele, e sua mulher e seus filhos fossem vendidos, com tudo quanto tinha, para que a dívida se lhe pagasse.
26 Então aquele servo, prostrando-se, o reverenciava, dizendo: Senhor, sê generoso para comigo, e tudo te pagarei.
27 Então o senhor daquele servo, movido de íntima compaixão, soltou-o e perdoou-lhe a dívida.
28 Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus conservos, que lhe devia cem dinheiros, e, lançando mão dele, sufocava-o, dizendo: Paga-me o que me deves.
29 Então o seu companheiro, prostrando-se a seus pés, rogava-lhe, dizendo: Sê generoso para comigo, e tudo te pagarei.
30 Ele, porém, não quis, antes foi encerrá-lo na prisão, até que pagasse a dívida.
31 Vendo, pois, os seus conservos o que acontecia, contristaram-se muito, e foram declarar ao seu senhor tudo o que se passara.
32 Então o seu senhor, chamando-o à sua presença, disse-lhe: Servo malvado, perdoei-te toda aquela dívida, porque me suplicaste.
33 Não devias tu, igualmente, ter compaixão do teu companheiro, como eu também tive misericórdia de ti?
34 E, indignado, o seu senhor o entregou aos atormentadores, até que pagasse tudo o que devia.
35 Assim vos fará, também, meu Pai celestial, se do coração não perdoardes, cada um a seu irmão, as suas ofensas.

A capacidade de perdoar vem da compreensão de que nós, e ninguém mais, somos responsáveis por tudo que nos acontece, de que nada é para mal e de que já somos objeto de graça e perdão tão grandes que não temos o direito de negá-lo a ninguém. Essa parábola mostra claramente que qualquer dívida que acharmos que nosso próximo possa vir a ter conosco não é nada comparado à nossa dívida para com o Eterno. Pois quem pode dizer que passa um dia sem errar, sem ceder ao Ietzer Hará? Quem passa um dia sem omissão, lashon hará, ira, covardia, medo, descrença, preguiça, procrastinação? Quem faz todos os dias, todos os mommentos, o melhor que pode? A capacidade de perdoar vem exatamente do que a parábola fala: da consciência de nossas próprias falhas. É através delas, olhando para dentro de nós mesmos, que entenderemos que nosso próximo é apenas um instrumento para nosso crescimento e que, perdoando-o, seremos perdoados na mesma medida. O próprio Yeshua intercede para que perdoados sejam aqueles que o crucificam na hora de maior dor: "Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem". Ele mesmo nos afirma que seremos julgados com a mesma medida que julgarmos nossos irmãos.
Em geral, temos pouca consciência sobre a importância do perdão. Não perdoando, não seremos perdoados, e não sendo perdoados, haverá separação entre nós e Deus. De modo que o principal beneficiado pelo perdão somos nós mesmos, e não aquele que é perdoado.

Yossef, o justo, faz na prática prova disso, quando entende que o perdão oferecido a seus irmãos permitiria a reunião da família, a vinda de seu pai ao Egito, a liberação de 22 anos de mágoa e de solidão. Ele tem consciência de que não foram na realidade seus irmãos que o venderam, mas o Eterno que o permitiu, em um plano maior para que toda aquela região fosse salva da fome, como ele mesmo afirma na parashá seguinte.
Primeiro, que nós tenhamos consciência de nossa dívida e do fato de que ela é sempre maior para com o Eterno do que qualquer dívida que qualquer pessoa possa ter para conosco, por maior que seja. Segundo, que nós tenhamos consciência de que, perdoando, estaremos primeiro livrando a abençoando a nós mesmos, para depois abençoarmos e liberarmos nosso próximo. E terceiro: se for difícil perdoar, que possamos pedir ajuda ao Eterno, principal interessado em que perdoemos, concientizando-nos de que todos nós, na realidade, um dia fomos um só com Ele e que um dia voltaremos a conviver sem essa ilusão de separação e antagonismo.